aproveitando a segunda chance

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sábado, setembro 16, 2006


O menor dos caminhos, o maior dos desafios, e a maior das alegrias


Acordei esse sábado querendo um desafio novo. Minha vida está sendo uma seqüência de desafios propostos e em seguida superados. A ida pra praça XI pra fazer o curso de silk-screen já não é mais considerado um desafio pra mim, é uma rotina que eu já faço quase que automaticamente, e por isso já nem tem mais tanta graça, e por isso eu só fico confabulando que outro desafio eu posso me propor para ter o gostinho de superar... ir mais distante, fazer algo mais difícil, fazer o inesperado para os outros, isso tem um gostinho bem único. Não exatamente por ser o primeiro a fazer tal coisa, mas sim por ser a primeira vez que você faz algo que nem você acreditava ser capaz de fazer antes.

Ontem à noite fui na social de aniversário de uma amiga, em Botafogo, e a cara de surpresa e alegria daquelas pessoas ao me ver aparecendo por lá foi o combustível ideal pra eu me propor outro desafio. Acordei hoje e pensei : "hummmm... minha moral tá alta...o que eu posso inventar de fazer hoje que eu nunca tinha feito antes?". Era uma manhã calma, um sábado acinzentado e com um certo vento. Resolvi então pegar esse vento na sala e sem cadeira de rodas!

Puxei o andador e fui me apoiando na minha perna. Arrastava um pouco o andador, e dava um passo, movia um pouco pro lado e mudava um pouco a direção, e assim fui me distanciando da segurança da minha cama e encarando os perigos do caminho sem garantias se eu cair pra trás, mas minha confiança era grande, e qualquer coisa eu podia me apoiar um pouco com o coto e a própria perna, dando um descanso pro braço.

Um momento especial foi quando eu passei pela porta do meu quarto. Fui invadido pelo clarão da luz, potencializada pelo branco do corredor. Aquele ponto de vista, de ver o corredor de cima, há muito tempo mesmo que eu não via, por isso foi difícil eu deixar passar isso como fato comum e comecei a chorar... um choro de superação, um choro de quem quis e fez, e que estava lá, testemunhando sozinho, mais um passo de sua vitória.

Aquilo me deu mais energia pra continuar caminhando, e já estava quase na metade do caminho, retornar daria quase a mesma distância e nenhuma glória, me restou seguir pra onde o nariz apontava. Ia seguindo já sentindo algumas dores no braço por fazer tanto esforço. Mudar de direção, jogar o andador pra frente, eram coisas que exigiam muito da minha força pois eu tava era colocando quase todo meu peso apoiado nos dois braços,compartilhado às vezes com minha perna, mas eu sabia que aquela dor ia passar, mas a minha satisfação ao final ia perdurar por muito tempo.

Fui adentrando a sala e logo sentia a brisa que vinha de uma pequena fresta na janela. Era o que eu precisava pra refrescar um pouco aquele momento, e também um estímulo para me aproximar daquela área, poder abrir a janela e me refrescar por inteiro. Fui me aproximando cada vez com mais vontade, mas os braços já não estavam mais agüentando tanto e por isso tive que fazer pausas pra descanso mais freqüentes, a cada dois passos até, mas sabia que eu ia, cedo ou tarde, chegar no meu ponto final.

Três metrinhos mais à frente e muito esforço a mais, finalmente chegava eu à beira da janela. Abro rapidamente ela toda e subitamente aquele vento todo me refresca como se fosse a grande recompensa por todo aquele esforço, eu finalmente podia voltar a olhar pra janela da altura que eu sempre olhava. O Cristo lá no Corcovado estava encoberto pelas nuvens, mas parecia que ele estava era deixando aquele minutinho de glória pra eu brilhar no lugar dele.

Olhei pra baixo, e numa dessas coincidências inexplicáveis, vejo passar pela rua o ônibus 435 ( pra quem não sabe, foi um ônibus dessa linha que me pegou, e desde então eu encaro qualquer ônibus com essa numeração como a personificação do meu algoz). Pareceu estranho demais aquela cena, até porque do 10° andar não dá pra ver o numero na frente do ônibus, mas só pode ter sido ele mesmo, que na minha mente testemunhava a cena e me olhava com jeito de "caramba, não esperava ter ver por aqui,hein?". Pois bem, senhor Ônibus, você me derrubou feia e covardemente, mas eu tô aqui de volta e de pé, VOCÊ NÃO ME VENCEU.

Nesse momento, depois de um vento tão forte que derrubou um vaso de flores que tava na mesa, surge minha mãe. Totalmente surpresa ao ver que eu estava perto da janela e não havia nem sinal de cadeira de rodas por perto... Me abraçou e me beijou (outra grande recompensa) e me disse que estava justamente agradecendo a Deus por toda coragem e força de vontade que eu vinha apresentando ultimamente, então imagina que surpresa maior ela teve de, logo depois disso, ver outra invenção da parte do Antonio rumo a sua reabilitação? Interessante também foi descobrir que, durante esse tempo todo que eu estava me esforçando pra realizar outro grande feito, minha mãe estava naquele mesmo momento, sem saber o que estava acontecendo, rezando por mim.

Nessas horas que eu agradeço bastante o fato de não ter desistido dessa vida logo após o meu acidente. Eu simplesmente não sentiria nada desse carinho e estimulo dos amigos, da força enorme que minha mãe sempre teve mas nunca tinha me mostrado, e nem sentiria esse gostinho especial que é o de realizar coisas simples, mas que eu poderia nunca mais ter a chance de fazê-las. Descobri que a força que eu tenho dentro de mim é muito maior do que a que eu aparentava por fora. Dentro desse corpo que um dia foi bem musculoso, havia uma força de vontade mais forte que sua própria embalagem, capaz de ir longe, carregando esse corpo mesmo que ele esteja com seus músculos enfraquecidos, atrofiados, ou simplesmente descontinuados.
 

Postado por Antonio Bordallo às 6:29 AM

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